A possibilidade de aquisição de medicamentos de alto custo pela via judicial: uma perspectiva jurídica

No Brasil, a saúde é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988. No entanto, a realidade do acesso a medicamentos de alto custo muitas vezes se choca com essa prerrogativa constitucional, deixando pacientes em situações delicadas, nas quais a única alternativa viável parece ser a busca por recursos judiciais para garantir seu direito à vida e à saúde. Nesse contexto, emerge a discussão sobre a possibilidade e legitimidade das ações judiciais para aquisição de medicamentos de alto custo.

A primeira questão a ser abordada é a definição do que são medicamentos de alto custo. Estes são aqueles cujo valor de aquisição é significativamente elevado, muitas vezes extrapolando a capacidade financeira dos pacientes ou do sistema de saúde público. Entre estes, encontram-se medicamentos para tratamento de doenças crônicas, raras ou graves, os quais podem ser essenciais para a qualidade de vida ou até mesmo para a sobrevivência dos pacientes.

O sistema de saúde brasileiro, embora estruturado sob o princípio da universalidade, não consegue, por vezes, prover todos os medicamentos necessários à população, especialmente aqueles de alto custo. Nesse contexto, os pacientes se veem diante de uma encruzilhada: ou desistem do tratamento por falta de recursos financeiros, comprometendo sua saúde e sua vida, ou recorrem ao Poder Judiciário em busca de uma solução.

As ações judiciais para aquisição de medicamentos de alto custo têm se tornado cada vez mais comuns no país. No entanto, sua legitimidade e conveniência têm sido objeto de debates acalorados. De um lado, há quem defenda que tais ações são necessárias para garantir o acesso à saúde, especialmente para aqueles que não têm condições financeiras de arcar com os custos dos medicamentos. De outro, há críticas de que essas ações sobrecarregam o Poder Judiciário, desviando-o de suas funções primordiais e criando um precedente perigoso de judicialização da saúde.

É importante ressaltar que a judicialização da saúde não é um fenômeno exclusivo do Brasil, sendo observado em diversos países ao redor do mundo. No entanto, isso não diminui a importância de se debater suas implicações jurídicas, políticas e sociais. Afinal, o acesso à saúde é um direito humano fundamental, e cabe ao Estado garantir meios eficazes para que todos possam usufruir desse direito, independentemente de sua condição financeira.

Do ponto de vista jurídico, as ações judiciais para aquisição de medicamentos de alto custo encontram respaldo em diversos fundamentos legais e constitucionais. O direito à saúde, consagrado na Constituição Federal, impõe ao Estado o dever de garantir o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde, o que inclui o fornecimento de medicamentos indispensáveis ao tratamento de doenças. Além disso, o princípio da dignidade da pessoa humana, também previsto na Constituição, exige que o Estado adote medidas eficazes para proteger a vida e a saúde de todos os cidadãos.

Nesse sentido, as ações judiciais para aquisição de medicamentos de alto custo funcionam como um mecanismo de proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos, quando o Estado se mostra incapaz de cumprir com suas obrigações constitucionais. É importante destacar, no entanto, que tais ações não devem ser encaradas como uma solução definitiva para o problema do acesso à saúde, mas sim como um último recurso, a ser utilizado quando todas as outras vias de acesso aos medicamentos se mostrarem ineficazes.

No RE 566471/SC, o STF reconheceu a responsabilidade solidária dos entes federativos (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) no fornecimento de medicamentos de alto custo, estabelecendo que todos devem contribuir para garantir o acesso à saúde.

Essa decisão destaca a responsabilidade compartilhada entre os entes federativos na garantia do acesso à saúde, inclusive no fornecimento de medicamentos de alto custo.

Assim, percebe-se que o Poder Judiciário tem papel fundamental na proteção dos direitos fundamentais à saúde e à vida, especialmente quando se trata do acesso a medicamentos de alto custo.

Por fim, é preciso ressaltar a necessidade de se buscar soluções estruturais para o problema do acesso a medicamentos de alto custo. Isso envolve não apenas a ampliação do financiamento público da saúde, mas também a adoção de políticas de regulação de preços de medicamentos e de incentivo à pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias farmacêuticas. Somente assim será possível garantir que todos os cidadãos tenham acesso efetivo aos medicamentos necessários para preservar sua saúde e sua dignidade humana.

Em suma, as ações judiciais para aquisição de medicamentos de alto custo representam um importante instrumento de garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente quando o Estado se mostra omisso em cumprir com suas obrigações constitucionais. No entanto, é fundamental que tais ações sejam encaradas como uma medida excepcional, a ser adotada apenas quando todas as outras vias de acesso aos medicamentos se mostrarem infrutíferas. Mais do que remediar casos individuais, é preciso promover políticas públicas que assegurem o acesso universal e igualitário à saúde, conforme preconizado pela Constituição Federal.